domingo, 13 de novembro de 2011

O fiat [1] de Sartre

 
          O texto pesquisado sob o título: O existencialismo é um humanismo de Jean-Paul Sartre, refere-se a “uma transcrição de uma conferência proferida em 1946” [2]. Por causa do positivo impacto causado por Sartre nesta defesa, a referida transcrição foi então publicada.
          Em pesquisas [3], verificaremos que Sartre posteriormente ao ano de 1946 rejeitou tal transcrição. Aqui cabe importante análise, uma vez que ao lermos a obra não é possível admitirmos que alguns anos mais tarde, o próprio Sartre pudesse rejeitá-la. Assim, poderíamos conjeturar que se tratou de um erro da home-page pesquisada[4]: talvez em razão de que Sartre ainda admitisse a necessidade de maior rigor científico antes de publicá-la.
          Uma vez vencida o que pareceu ser uma contrariedade de registro histórica, o que sem dúvida representou um primeiro obstáculo para a compreensão de Sartre, deveremos nos ater em que a leitura de “Existencialismo É Um Humanismo” [5] tem relação de importância fundamental para a ética.
          O fundamento existencialista; a liberdade advinda do não-Deus; o homem intersubjetivo; os juízos e finalmente uma conclusão, são os pontos sumarizados que foram estabelecidos a fim de poder responder o quanto é fundamental esta obra para os propósitos de uma ética contemporânea.
          Portanto, “Existencialismo É Um Humanismo” nos remete a um Sartre bastante completo a ponto de apontar este texto como sendo excelente introdução à leitura sartreana para todo estudante de Filosofia. Será, pois este o meu intento: de procurar argumentações que vibrem o autor no sentido de que o leitor de “Existencialismo É Um Humanismo” estabeleça expectativas próprias a todas, ou qualquer uma, obras de Sartre – e nisto também me incluo.

O fundamento existencialista

          “A existência precede a essência[6], este é pensamento nuclear de Sartre ao expor que, será a partir do existencialismo que “a vida humana é possível[7] Poderá parecer que Sartre esteja justificando o humanismo somente a partir do existencialismo, mas mais do que isto, ele está apresentando uma analogia entre uma existência que precede à essência, sendo que esta essência também pode ser negativa. Assim, se houver uma possibilidade contraditória no existencialismo sartreano será aquela em que: se a essência tem a possibilidade de ser negativa, então porque caracterizá-la naquela própria expressão – a existência precede a essência – como logo após os termos “a existência precede a”, isto é, após existência? Ora, se for assim, então o termo essência em sua negatividade suprimirá o termo anterior (existência), causando então a contradição; assim, se a essência for negativada, então há erro contraditório, ademais, se a questão da essência não for esclarecida adequadamente poderá incorrer na própria extinção do existencialismo. Isto é, mesmo que imaginarmos que o existencialismo nasce como ideia e quando tal ideia vai viver o mundo só se subsistirá através de outro termo: o humanismo. Assim, a demasia em justificar a negatividade da essência poderá incorrer numa importância textual ao próprio termo essência talvez maior que o termo existência. Tal contrariedade observada parece nos dizer que Sartre não tenha se preocupado se a ocorrência desta contrariedade poderia ser relevante ou não, mesmo porque Sartre se apoia naquele existencialismo vindo da angustia kierkegaardiana[8] da relação do eu para com o exterior. Contudo, mesmo assim Sartre parece omitir outra relação do “eu” de Kierkegaard e nisto, Sartre vai diferenciar diametralmente em oposição ao existencialismo de Kierkegaard quando este vai tratar da relação do “eu” com o mundo interior que ocorre pelo desespero e de como ele (Kierkegaard) vislumbra extirpar completamente tal desespero: “[...] orientando-se para si próprio, o eu mergulha, através da sua própria transparência, até ao poder que o criou.[9]. Para o existencialismo de Sartre isto não é possível porque tal poder que crie – e este poder pode ser entendido aqui como Deus – não existe: a existência supera a essência.
          Quando, porém, Sartre vai tratar do humanismo deve necessariamente recorrer à essência, mas não para negá-la, mas para constituir a verdade do existencialismo. Nisto, não que o existencialismo não possa ser humanismo, longe disso – até porque foi demonstrado que, por excelência, o existencialismo nasce como pensamento – porém, o existencialismo terá uma relação equivalente a humanismo na subsistência da essência. Eis aqui o grande desafio sartreano que tal transposição estabelecerá ou não a contradição pré-anunciada, muito embora, mesmo assim esta contradição é uma contradição apenas técnica – textual que não deve invalidar o existencialismo enquanto pensamento filosófico. A menos que a própria característica textual e subjetiva de lidar com diferença entre “natureza humana e condição humana” [10] demonstre que o pensamento de Sartre esteja organizando seu posicionando diante daquilo que a Igreja defenda sobre a natureza de Jesus, então tal característica contida ou tímida de Sartre, em não usar a pena de maneira ingênua diante da Igreja, vai demonstrar que embora já houvesse publicado a obra “Ser e o Nada”, o existencialismo sartreano ainda está formulando um consistente pensamento filosófico para que antes de chegar à sua plenitude deve, tal pensamento, confrontar-se num Armageddon em seu próprio ateísmo. Portanto, explorar tal pensamento filosófico de Sartre é o que se espera que um filósofo persuasivo realize.

A liberdade advinda do não-Deus

          O existencialismo de Sartre trata o homem de tal forma com imenso zelo, cuidado e importância que trabalhará com uma possibilidade, ou hipótese, da ocultação de Deus, para que o próprio homem perceba sua humanidade através daquele traço marcante que chamará de liberdade.
          Quase que em substituição – e isto deve ser motivo de profundo estudo – Sartre vai caracterizando o desespero como um desamparo onde: “[...] se Deus não existe [...] Estamos sós, sem desculpas. [...] o homem está condenado a ser livre.[11] Assim, seria possível deixar o homem a mercê de si próprio. Fazendo aqui uma afirmação um pouco mais contundente, porém não dita por Sartre, seria de tratar Deus como um aprisionador do ser humano: se pensarmos não como o ateísmo pregado no existencialismo sartreano, mas sim como um crente, poderíamos necessariamente chegar à mesma conclusão de que realmente Deus, a partir da visão humana de Sartre, aprisiona o homem, porque Deus é a desculpa do homem – o que nenhum crente realmente pode deixar de afirmar é que Jesus carregou sobre si toda a culpa: “Mas se alguém pecar, temos um intercessor junto ao Pai, Jesus Cristo, O Justo. Ele é a expiação pelos nossos pecados [...][12] – assim o termo liberdade como a liberdade do próprio homem seria contraditório ao próprio crente, por que nisto Deus, então, aprisionaria o próprio ser humano.
          Para centrar no próprio ser humano que nele é ativada a liberdade, então Sartre necessariamente deve abdicar da existência de Deus através de um ateísmo que mantém Deus num estado latente, isto é, que não pode ser perdido de vista. É assimilável, portanto uma visão de ateísmo sartreano muito mais para um não-Deus do que a eterna inexistência de Deus. Nisto podemos conjeturar a partir de seu exemplo textual ciclo vicioso [13], outro ciclo vicioso, agora referente a Deus que se irrompe quando Sartre vai tratar da liberdade do homem.
          É então preferível para Sartre lidar com a questão de Deus como um “looping” ou ciclo vicioso que alterna possibilidades de teísmo e possibilidades de ateísmo como uma questão que não trará nenhum predicado ao homem, por não vir dele mesmo. Daí o interesse de Sartre de manifestar-se ateu. É somente assim que Sartre “mais a vontade” desenvolve seu existencialismo tratando o humanismo como liberdade inerente ao próprio homem. Este humanismo nasce a partir de uma visão absolutamente subjetiva do homem para com si próprio: “[...] o homem nada mais é do que o seu projeto; só existe na medida em que se realiza [...][14].

 O homem intersubjetivo
         É aqui que mais claramente Sartre vai moldando o fundamento ético de seu pensamento o que poderá ser síntese para muito do que se espera do estudo da ética em nossa contemporaneidade.
          O compromisso que estabelece do homem com o outro sendo este considerado por Sartre como: “[...] indispensável à minha existência [...][15] é o que Sartre chamará de intersubjetividade. Contudo a que se velar pela forma e conteúdo do que seja este outro. Pela forma certamente o outro se encaixará no papel necessário que cabe a cada um na responsabilidade a que nossa liberdade nos remete, entretanto, quando tratamos do conteúdo do termo – outro – surge a dúvida: relacionar com o outro não seria o mesmo que adentrarmo-nos muito mais na essência do próprio outro do que em sua existência? Não seria, pois o outro uma nota de questão contraditória acerca do pensamento sartreano? – Interessante notar que ao longo do “Existencialismo É Um Humanismo” Sartre sempre se refere a terceira pessoa do plural, nós quando está justificando as críticas; é justamente este nós que podemos dá-lo em conotação à intersubjetividade humana e aqui residirá uma ponta de refutação à contradição ré-mencionada. Assim, Sartre não poderia estar se contradizendo porque a liberdade é própria do existencialismo e é justamente em seu nós – em um sentido mais a priori, poderia caracterizar muito bem a intersubjetividade. É, pois no homem intersubjetivo que justamente existe aquele nós que ecoa no em si antes mesmo de compreendê-lo fisicamente.

Os Juízos

               Mas, se o engajamento é a palavra de ordem que caracteriza a liberdade, e se o homem possui uma intersubjetividade a priori no que faz se valer em si por nós, então parafraseando Sartre [16]: como estabelecer a liberdade com decisão e engajamento pressupondo aquele nós a priori? O que cada o homem intersubjetivo deve fazer?
          Deve-se o homem, neste instante de criação moral, se valer de razoáveis medidas ou mecanismos mentais de mensuração para comparando e comparando-se seguir na trilha formatada pela sua própria liberdade de decisão. Trata-se de um ponto nevrálgico para o estudo da Ética. Segundo Sartre: “[...] cada um escolhe perante os outros e se escolhe perante os outros [...] isso talvez não seja um juízo de valor, mas é um juízo lógico [...][17].
          Se o juízo é lógico então o existencialismo sartreano vai estabelecer uma crítica à liberdade kantiana na qual “[...] os juízos são funções [...][18]. Assim, Kant baseia seu juízo em uma função lógica a partir das diversas representações do conteúdo: “[...] a lógica geral abstrai de todo o conteúdo [...] e espera que em outra parte qualquer [do sujeito (analítico transcendental)] lhe sejam dadas representações a fim de primeiramente transformar em conceitos [...][19]. Será neste “transformar em conceitos” que Sartre faz a crítica, uma vez que para ele o juízo só pode haver através de uma “invenção” que é própria de uma liberdade tal, que não fique baseada em princípios, mas em ações: “[...] princípios abstratos demais não conseguem definir a ação [...][20]. Quando Sartre lida com estes juízos ele está lidando num mundo “[...] concreto e, por conseguinte, imprevisível [...]” [21]. Portanto, duas morais opostas podem, e não há nenhum erro contraditório nisto, ser equivalentes pela atitude de liberdade. Disto não poderíamos nunca nos precipitar em criar um relativismo, visto que Sartre está buscando o mais a priori possível concretizar a liberdade pelo juízo e nisto a ética é fundamental.

          “Existencialismo É Um Humanismo” é sem dúvida a porta de entrada para uma ética contemporânea. Talvez pelo motivo de tal pensamento venha de encontro a uma justificativa do homem não em razão de qualquer coisa que não seja ele mesmo; também por outro advindo do primeiro que tal pensamento se popularize num mundo concreto de Sartre que para nós poderia residir na ilusão de suas peças teatrais, mas que muito longe disto, não seria a arte sartreana que descaracterizaria consistente pensamento; a popularização de Sartre por pessoas que o consomem para justificarem a si próprias não é, com certeza, o intento de nosso filósofo; ao contrário, Sartre deseja ardentemente elucidar um problema que a resposta não está nele e nem no eu, está em nós. Entender que Sartre dá início a um pensamento absolutamente lindo e que necessita dos mesmos cuidados de que uma flor requer para que exista, será algo que faltará em muitas das pessoas que criarão conceitos políticos a partir de examinar Sartre como se este fosse um fim. Não. Sartre não é um fim. Também a popularização do existencialismo levaria a pseudos-filósofos  iluminados de uma vela e não de um Sol platônico, o que culminaria com pensamentos que retratariam culturas (música, dança, teatro, textos) ainda inconsistentes que capitalistamente seriam midiatizadas desintegrando um Sartre inventor. A popularização deve chegar enfim ao estudante de Filosofia para que possa trabalhar junto com Sartre e de alguma maneira cada vez mais clara conseguir sintetizar Sartre primeiro à Educação. O existencialismo de Sartre deve ser sempre reconstruído quando atacado, ressuscitado quando em nós a liberdade não é compreendida e “fiat” quando nos vemos em mim mesmo.

Referências Bibliográficas
BÍBLIA, JOÃO, Apóstolo. Primeira epístola de São João. Tradução: † Frei João José Pedreira De Castro. 136. ed. São Paulo: Ave-Maria, 2000.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holana. Novo dicionário de Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1988. 687 p.
KANT, Immanuel. Crítica Da Razão Pura. Tradução: Valerio Rohden e Udo Baldur Moosburger. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1999, 511 p.
KIERKEGAARD, Søren Aabye. O desespero humano. Tradução: Adolfo Casais Monteiro. Os pensadores, vol. XXXI. São Paulo: Abril Cultural, 1974, 92 p.
SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. Trad. Rita Correia Guedes. USP, Stoa, espaço de Joao Alex Costa Carneiro. Junho de 2011. http://stoa.usp.br/alexccarneiro/files/-1/4529/sartre_exitencialismo_humanismo.pdf (acesso em 21 de Outubro de 2011).


[1]    (FERREIRA 1988. p. 295. (fíat). [Lat., ‘seja’.] S. m. Faça-se; criação.)
[2]    http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean-Paul_Sartre
[3]    Ibidem
[4]    Ibidem
[5]    (SARTRE 2011)
[6]    Ibidem, p. 3
[7]    Ibidem, p. 2
[8]    Ibidem, p. 6
[9]    (KIERKEGAARD 1974, p. 338)
[10]  (SARTRE, 2011 p. 21-22)
[11]  (Ibidem, p. 7)
[12]  (BÍBLIA, 2000, p. 1550 [1Jo, 2, vs. 1-2])
[13]  (SARTRE, 2011 p. 9)
[14]  Ibidem, p. 11
[15]  Ibidem, p. 13
[16]  Ibidem, p. 15
[17]  Ibidem, idem.
[18]  (KANT 1999, p. 103)
[19]  (KANT 1999, p. 107)
[20]  (SARTRE, 2011, p. 17)
[21]  Ibidem, idem.

sábado, 15 de outubro de 2011

15 de Outubro: presente ao Professor

             O maior desafio do Homem talvez seja conseguir agregar valores não expressos materialmente a outro valor pré-existente. A linguagem pode ser um instrumento interessante para isto, muito embora o que está em questão neste desafio é a boa apreensão do valor agregado. Imaginação... Sensação... Tudo é esperado, mas sempre requer a comparação com a manifestação física do valor - um presente. Como colocar, agregar o valor em contato com o conhecimento de maneira absolutamente sem precisar-se do contato físico com tal presente que expresse o valor que queiramos agregar?
             O Professor é um valor absoluto. Mas que está aberto para agregar valores. De certo que valores que se agregam a valores serão sempre valores absolutos. Notas, trabalhos, conversas e linguagens deveriam ser sintetizados em algo que antes que formássemos qualquer valor a agregar já pudessem ser percebidos como valores agregantes ao nosso valor chamado professor.
             Assim, quando queiramos empreender tal desafio, todas as barreiras interpostas são vencidas, dificuldade é reduzida a simplicidade, como tudo aquilo que não vemos; pois o que vemos é apenas a luz refletida nas coisas. Então, se fechássemos os olhos, isto poderia resolver as dificuldades em simplicidades?
             Ainda e mesmo assim persiste o maior desafio do Homem. Melhor que conseguir agregar algum valor ao nosso querido professor é continuarmos seguindo persistentemente, a seu lado, sua maestria.
             Com os votos de um feliz quinze de outubro a todos os professores.

domingo, 9 de outubro de 2011

Mapa Conceitual sobre uma parte da Metafísica de Aristóteles.

Veja em Meus Links o link para download grátis do programa

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Eita...! Comprii dua televizão da fina e um cumputadô. Ja sô sidadaõ! [pontuação minha]

          O propósito do título já demonstra a atualização aos nossos dias que quero oferecer sobre o texto do capítulo 1 do livro 1 de A Política de Aristóteles.

          Antes, porém, partiremos a especular uma característica de Atenas enquanto Pólis, a qual se refere à sua área geográfica. Atenas era uma Pólis constituída por: Acrópole, Ágora, Khora e Astey[1]. A área agricultável, Khora, servia à parte urbana Astey (cidade). Os habitantes desta área agricultável eram os camponeses atenienses. Todos os indivíduos da Pólis poderiam refugiar-se no templo (Acrópole), se oprimidos por situações de guerra.

          O que importa dizer é que os camponeses atenienses eram os mais simples e poderiam não ser assíduos participantes das assembléias na Ágora (praça), entretanto isto não significaria que estes fossem excluídos da sociedade ateniense, até porque sua atividade econômica é importante para Pólis. Renato Janine Ribeiro (apud, RIBEIRO 2010) vai nos dizer sobre o pouco tempo da democracia ateniense onde no seu auge dezenas de milhares de pessoas participavam em cerca de quarenta assembléias por ano na Ágora, o que em média nos dariam o número de: uma assembléia a cada nove dias. Portanto o homem que não fosse participante deste procedimento social seria considerado um idiótes: “[...] idiótes, não sai de si próprio, não participa da coisa coletiva [...]” (RIBEIRO 2010). Visando oferecer uma justificativa para o termo idiota, o qual é encontrado no site da Wikipédia, encontraremos: “(do grego idiótes, o homem privado - em oposição ao homem de Estado, ou público; ou na acepção vulgar aquele absolutamente ignorante em algum ofício, homem sem educação [...]” (2011). Devemos observar que não seria um tipo de discriminação social enquanto vida humana, visto que, a todo ateniense seria dada a mesma segurança na Pólis. Contudo, o ateniense para ser considerado cidadão deveria não ser escravo e decidir-se por querer participar da coisa coletiva, ao contrário daqueles idiótes. Portanto, optando por ser cidadão exercia o direito de voto como participante da Eclésia: “[...] além de aprovar ou rejeitar as leis propostas pela Bulé [sic], a Eclésia controlava as verbas e contas dos magistrados, adquirindo ainda o direito de declarar guerra e assinar tratados de paz.” (HOLANDA, et al. 1979, 289 p.)

          Diante do entendimento exposto ficará mais clara tal característica social ateniense, quando Aristóteles traduzí-la para as páginas de sua obra, A Política (ARISTÓTELES, A Política 2007), onde procura “conhecer melhor as coisas compostas, decompondo-as” (ARISTÓTELES, A Política 2009). Assim, textualizando, Aristóteles espera colaborar para a permanência de uma prática social que leve o homem para uma boa vivência, para um bem estar: sua felicidade (Eudaimonia).

          Toda esta historicidade é para demonstrar quão grande dista em tempo o surgimento da democracia. Embora muito tempo já se passou, a democracia continua viva como regime de governo válido para o mundo todo. No Brasil o marco mais evidente do retorno à democracia foi quando a população exigiu o fim da ditadura militar através da campanha diretas-já anos 80. A democracia grega ainda tem impactado sobre certos ângulos o regime de governo brasileiro, como por exemplo aquela “social-democracia” (Fernando Henrique Cardoso) ou com o atual “estado democrático de direito” (Lula). Não podemos dizer que não vivemos num país que respira democracia, não é mesmo? Entretanto, ainda ocorrem algumas dicotomias que se assemelham àquela Atenas antiga. Vejamos apenas considerando a seguinte pergunta: atualmente, é mais gostoso morar (viver) num centro urbano do que na área rural? Certamente que a resposta será sim em razão do conforto e certas facilidades que a vida na centro urbano possibilita, além do que o centro urbano é um local onde se controlam as riquezas produzidas nela mesma e também das áreas rurais. Contudo, poderia dizer aqui várias vantagens da área rural, que são verdadeiras e dignas, entretanto, para acurar minha reflexão, volto a questionar-me: quem já vive num centro urbano conseguiria, tal indivíduo, permanecer vivendo numa área rural por período de tempo indeterminado? Para que deliberadamente possa negar permanecer no centro urbano trocando-o pela área rural, muito provavelmente, este indivíduo poderá carregar consigo o desejo de – eu diria –  “aposentar-se” daquela vida do centro urbano e de seus compromissos sociais que dele derivam. Neste sentido de pensamento, este indivíduo poderia estar negando também sua cidadania. É neste ponto que podemos referenciar-nos aos idiótes da Atenas antiga. Mas também existem aqueles que nasceram e vivem na área rural brasileira e que dificilmente embrenham-se àquela situação de participante de uma vida social, porque achem que isto é coisa apenas de gente que more nos centro urbanos. Ou então, poderemos considerar aquela outra justificativa na qual os nativos-rurais se sentem excluídos por aquela gente lá da cidade. A este ponto poderemos também questionar: excluídos? Como? Se há 8 anos vivemos num “estado democrático de direito”? Afinal é direito deste nativo-rural participar do estado democrático, não é mesmo? Ele sabe disso? Ou só sabe porque “ganhou” um título eleitoral?

          Bem, é claro que o objetivo maior desta participação não é de estabelecer unicamente uma reflexão à vida campestre brasileira. Vamos imaginar por outro lado aquele que vive nos centros urbanos e de certa forma participa mais socialmente, visto que, está próximo ao local das decisões políticas: prefeituras, câmaras de vereadores, etc. O que é que o torna cidadão? Será que é aquele regime democrático de um país que vive o “estado democrático de direito”? Será porque mora ao lado de uma prefeitura? Será porque assina um jornal diário ? Será porque simplesmente vota? Será porque tem cabo telefônico com internet de baixo custo? (vale lembrar que as internets via rádio não tem potência para longas distâncias e que acabam se confinando como concorrentes das tradicionais via cabo dentro das próprias centro urbanos).

          Antes de continuar minhas reflexões me detenho a lembrar daquele animal político afirmado por Aristóteles. De certo, esta foi uma feliz assertiva de Aristóteles e que tanto mais foi verdadeira, tanto quanto lhe faltou termo mais apropriado para melhor definir tal caracteristica humana. Digo isto porque atualmente possuímos um termo que bem caracteriza aquele homem como sendo um animal político. Este termo refere-se capacidade de expressão do homem, i. é., sua linguagem.

          O que, enfim, torna uma pessoa de qualquer lugar do Brasil um cidadão? Se por natureza o homem é um animal político como afirma Aristóteles, então porque achamos que ainda existam pessoas sem a consciência de serem cidadãos?     Será que estas pessoas já não querem mais enfrentar problemas? Será que tem medo? Será que querem apenas tranquilidade como se tranquilidade fosse felicidade? Ou será que querem mesmo ser cidadãos? Ou mesmo querendo não conseguem, visto que, já estão classificados como cidadãos de direito? Mas... Não deveriam antes ser, cidadãos de fato?

          Ou o pensamento de Aristóteles é falso ou nossa sociedade brasileira (e nela me incluo também) está tolhendo a cidadania de seus indivíduos. Será por conta de algum interesse que desconhecemos? Mas, como poderei questionar sobre um país que tolhe a cidadania de seus indivíduos, uma vez que, nossa sociedade é “social democrática” e mais ainda, vive um “estado democrático de direito”?

          No Brasil, jargões políticos tem a triste finalidade de encurtar a verdade para seu cidadão. Ops! Digo, sidadaõ.
 
Referência Bibliográfica:
HOLANDA, Sérgio Buarque de, Carla de QUEIROZ, Sylvia Barbosa FERRAZ, Virgílio Noya PINTO, e Laima MESGRAVIS. História da civilização. Coleção Sérgio Buarque De Holanda. 7. ed. São Paulo, SP: Companhia Editora Nacional, 1979, 289 p.
 E - Referências:
ARISTÓTELES. A Política. 05 de Maio de 2009. http://www.livrosgratis.net/download/357/a-politica-aristoteles.html (acesso em 20 de Agosto de 2011).
RIBEIRO, Renato Janine. CPFL - Cultura. 03 de Setembro de 2010. http://www.cpflcultura.com.br/site/2010/09/05/os-cuidados-com-a-intimidade-%E2%80%93-renato-janine-ribeiro/ (acesso em 20 de Agosto de 2011).
WIKIPÉDIA. Idiota. 31 de Julho de 2011. http://pt.wikipedia.org/wiki/Idiota (acesso em 20 de Agosto de 2011).


[1]  (WIKIPÉDIA 2011)

quinta-feira, 5 de maio de 2011

É possível amor em Filosofia?

           Sabem daqueles momentos que quando lemos saímos de nós mesmos entramos na página e  pensamos em muitas coisas a medida que lemos. Ficamos bravos com nós mesmos porque nos distraímos e novamente ao ler, nossa alma teima a desencarnar querendo se fixar em algo que parece ser desconexo? Pois é, isto aconteceu comigo. Milagre, ilusão, premonição, razão... Conversão? Ainda bem que só após uma profunda reflexão ordenamos tais pensamentos pela linguagem escrita. Por isso, senti a necessidade de escrever sobre algo que ocorre em qualquer sala de aula, pois me lembrei não apenas da óbvia vivência de discente, mas também da prazerosa experiência como professor de ensino médio e ensino superior na área de Ciências Contábeis que tive há duas décadas.

          Mas, como ia dizendo, senti então uma necessidade de escrever. Acredito que esta necessidade decorra daquele “criar conceitos” de grandes pensadores como Deleuze e Nietzsche. Será que tenho um conceito em concepção neste momento? Será mesmo? E então, vamos ver? – Vou fazer um exame igual àquele diagnóstico que se faz na gestante para ver como está a saúde do bebê. Aplicarei este “ultra-som” na natureza deste meu pensamento. Para começar, vou considerar ser necessário transformar a sala de aula em um laboratório, como aqueles ligados à biomédicas. Já o mundo inteligível, as idéias e o racionalismo em si são importantíssimos, e nascem, por aquela "maiêutica (parto) socrática", em cada aluno por uma experimentação muito semelhante ao que Hobbes, Locke e Hume - empiristas da Ilha pregavam. Portanto, além dos alunos, além do método socrático, além de um mundo inteligível e muito além dos contratos empiristas, existe uma parte a ser examinada de importância ímpar: o professor. Estabelecerei então que o professor é apenas um órgão que vai ter a desafiadora função de uma válvula reguladora do fluxo de ida e volta do conhecimento e sua aquerência pelo aluno. O uso desta válvula tornará possível a compreensão entre: 1) inatismo ou o conhecimento racional e teórico e 2) uma filosofia empírica que deve ser metódica e experimental. Neste sentido o professor criará conceitos a partir de ser válvula que regulará o fluxo de (1) e (2) do aluno para o próprio aluno. Tal ação causará nos alunos uma compreensão sobre o método de aula a partir da metodologia racional-empirista criada pelo próprio professor naquele momento. Portanto, será através do professor, que cada célula filosófica (aluno) voltará a si própria, onde em cada uma serão muito mais criados, recriados e modificados os conceitos que são externados passando sempre por aquela válvula onde cada célula vai provar se compreende ou se é compreendida, sempre dela para ela mesma.

          Pelo exposto, com efeito, o professor em sala de aula deve estar protegido – proteção em tempo real como um antivírus de computador – senão esmorece, cai e perderá aquela dignidade[1] de cada uma daquelas células filosóficas. Importante notar que a perda da dignidade do aluno poderá significar como se esta dignidade caísse naquele rio chamado pensamento democrático onde, aliás, atualmente tudo é possível cair nele. Dessa forma este rio acaba sendo a justificativa irrefletida de qualquer célula filosófica, uma vez degenerada e cancerosa que comprometerá todos que com ela vivem, afinal de contas, nosso exame chegou até aquela pequenina célula que é base para uma vida que sempre nasce. 

          Enfim, o professor de filosofia deve estar sempre protegido pelo amor. (por favor, leia o título) 
________________________
[1] Deixo claro que quando digo “aquela dignidade” me refiro à dignidade do aluno e não do professor.

domingo, 10 de abril de 2011

A verdade contida no Homem e a verdade contida no indivíduo

Armando Poli Junior - CEUCLAR - Pólo Campinas
03/04/2011

Sumário

Introdução
I.... A contemplação da essência do Homem e o problema do indivíduo.
II... O exemplo do problema acadêmico
III.. A imagem do Homem.
IV...O Homem-imagem.
V ... A dor e a fuga.
Conclusão – O encontro sem busca.

Introdução
Se a contemplação da essência do Homem se desse de modo absolutamente simples, teria esta contemplação, necessariamente, que constatar algo da essência humana que muitos não a observam e bem poucos tentam inutilmente retratá-la. Refiro-me à verdade.
A reflexão que nos introduz ao tema deste artigo – “A verdade contida no Homem e a verdade contida no indivíduo” – pressupõem que o ser humano universal (daqui por diante Homem), só pode ter conhecido o sentido à sua existência, por nada mais e nada menos do que o próprio indivíduo humano particular.

I - A contemplação da essência do Homem e o problema do indivíduo.
Pergunta: será apenas a partir da contemplação da verdade pelo individuo que se dá o sentido existencial do ser humano que é universal? A partir desta e de outras, vislumbrarei possíveis soluções.
Deste tipo de contemplação provocada pela pergunta inicial já estão repletas as prateleiras de bibliotecas e livrarias com inúmeros gêneros literários. Continuemos, outra pergunta: seriam estas literaturas – que trazem em seu conteúdo verdades já experimentadas por outros – suficientes para o individuo sentir-se adequadamente, completo, equilibrado, coerente e ter enfim a paz?
Ou afinal, a verdade está bem à frente dele? Ou ainda quando caminha ou percorre as ruas com um veículo, o indivíduo então se defronta com a verdade? Ou ela está escondida lá na biblioteca ou na livraria?
Neste ponto há que ser fazer referência ao que Castañon nos diz: “[...] o que é real não é verdadeiro, nem falso, ele simplesmente é.” (2007, p. 15).
Isto posto, se o leitor me permitir dizer, afirmo sem temer de que eu mesmo duvido que a verdade seja fácil de encontrar. Dizem que existe sempre verdades nos gêneros literários clássicos como por exemplo, a Bíblia Sagrada. Tal dizer pode ser enquadrado até como um axioma. Mesmo que um indivíduo não pertença a, por exemplo, um grupo estudantil, ele pode muitas vezes estabelecer leituras que o agradem e que o tranquilizem. Mas será que isto, ainda assim, não se trata de uma maneira contemplativa de ver a verdade do e no outro? – pois estamos nos referindo a gêneros literários.
Vejamos por outras formas de apresentações: tv e rádio. Televisão e rádio são outros meios pelos quais um indivíduo – da mesma maneira que num livro se não mais – estabele conexões contemplativas de verdades.
Pergunto: se a verdade é vista sob esta ótica contemplativa, então seria correto afirmar que tal ótica oferece a solução daquele sentido existêncial do Homem?

II - O exemplo do problema acadêmico
Vejamos uma outra situação-problema muito comum e que se refere ao cotidiano acadêmico: o aprendizado dos alunos – que se não são, então deveriam ser assíduos leitores nem que os de pouca idade lessem apenas gibis. Neste universo acadêmico a leitura deveria ser farta e também todos deveriam congratular-se por sentirem-se completos, repletos de conhecimento, em paz com todos e com uma sensação de equilibrio e responsabilidade que os impulsionam para novos desafios. Mas sabemos que a realidade não nos mostra isso.
Então, vamos ter mais problemas acadêmicos para solucionar? Vamos refletir:
• Seriam os professores mal preparados, ou desmotivados?
• Seriam os professores os detentores de grande quantidade de conhecimento, mas por outro lado com “conjunto vazio” em seus pensamentos?
• Seriam os alunos que manifestam sua inconsciente revolta ao sistema sócio-econômico através de enfrentamentos ao meio em que vivem e estudam e que por fim fragilizam ainda mais o sistema social de nosso país?
Na tentativa de estancar o problema acadêmico para que dessa forma, não cheguemos a invadir outra área, qual seja a sociológica, iremos trabalhar filosoficamente aquele sentido existencial do Homem a partir da idéia básica da qual: educação e filosofia sempre andaram juntas e sempre foram retratadas de forma histórica.
Veremos o que Prado Junior nos diz a respeito desta historicidade filosófica quando ele cita o nome do filósofo Hegel:
“[...] desse confronto realizado por Hegel entre a História e a Filosofia - não a simples aplicação da segunda à primeira, ou vice-versa, como outros muitos já tinham antes realizado, mas a fusão íntima e completa das duas ordens de pensamento - que brotará a concepção genial do filósofo. Hegel inspira-se na História para fazer Filosofia, e na Filosofia para fazer História. [...] graças a ele se articularam pela primeira vez duas esferas até então apartadas: a do Conhecimento (objeto da Filosofia), e da experiência, da prática histórica da humanidade (representada na História)." (1955, p. 368-369)

Aqui o problema acadêmico começa a deslindar-se, visto que a ênfase por uma História bem trabalhada, i.e., bem aplicada aos alunos é falsamente pressuposta pelos próprios alunos como uma “não-verdade”. Resumindo, a História não é aplicada paralelamente com uma análise filosófica sobre o seu próprio conteúdo histórico.
Mas então onde está o problema acadêmico? Nos livros de História? Ou está na Filosofia que na escola não atende às regulações históricas? Numa primeira reflexão, vejo que o problema não está na História, muito embora, já esteve. Quanto à Filosofia, visto que, este tipo de problema ainda teima ser recidivo por não se fazer uma verdadeira filosofia da história, então sempre existirá sua temeridade. Portanto, governo, educadores e pais devem estar sempre atentos para um estudo que prestigie o ser e sua essência, o Homem.
Uma vez que foi estabelecida uma proposta para a solução parcial do problema acadêmico, ainda persiste uma pergunta que potencializa novo problema: como ficará assegurada aquela verdade que dá sentido ao Homem?

III - A imagem do Homem
Como numa abordagem antropológica estabelecerei uma crítica a esta sociedade, que parecerá irônica, mas que circunstanciará de melhor modo o problema da verdade como sentido existencial do Homem.
Se observarmos uma mídia propagandista em que, por exemplo, observa-se o lançamento de um automóvel com os dizeres de que tal carro “provém da alma humana” ou que n’outro exemplo uma instituição financeira bancária ensina a ser e não a ter, então poderia eu imaginar que verdadeiramente estou presente a uma sociedade que dá sentido ao meu ser? O absurdo é tal que indivíduos que observam tais sinais midiáticos, embora saibam que se trata de falácias propagandistas, vão assumindo, dia após dia, uma postura de ser que mais o anula do que o edifica. Esta inversão de postura à qual cada indivíduo vai se adequando também vai confundindo-o. Então, o indivíduo é “necessariamente” lançado dentro da contingência social de uma busca sobre aquilo que já está confundido dentro de si.
Outra característica fabulosamente inventada, no tocante aos relacionamentos, é a de fazer a “experiência do casamento”. Se der certo tudo bem, senão tudo bem também, pois o que importa é que cada indivíduo que busca este tipo de experiência saberá que estará mais próximo de obter um sentido existencial humano, que mais uma vez chamo atenção, já estará confundido dentro dele.
Então quando o indivíduo se vê em uma imagem no espelho de sua toalete numa manhã dominical, pode a princípio estabelecer algumas ações de asseio chegando até ao embelezamento estético. Porém, (como tem um pouco mais de tempo do que em outros dias da semana) se permanecer alguns segundos a mais seu semblante poderá mudar. Poderá ser crítico consigo mesmo. Não poderá, de certo, ficar ainda mais segundos, mas se ficar talvez tente responder a si mesmo sobre porque está ali naquele instante? – ou outra reflexão como aquela rápida reflexão de fim de ano que alguns fazem.
Ele está se defrontando com aquilo que comporta a universalidade do ser humano, seu corpo. Continua... Faz comparações, críticas e análises; superficiais e profundas. Ele procura o que não sabe. Está diante do Homem.

IV - O Homem-imagem
Em muitos outros momentos de sua rotina cada indivíduo se vê em várias imaginações. O interessante notar é que sempre há algo que o coloca de frente a estas imagens. Se não é a mídia com suas propagandas e tragédias, são as próprias ruas com as belas casas e carros; os prazeres do apetite e da sexualidade; também a pobreza com suas doenças e vícios.
Em grau decrescente o individuo vai caindo tanto quanto as energias revigoradas por uma noite de bom sono, também vai se esvaindo ao longo do dia e parece que às vezes ambas energias e por do sol repousam o semblante de alguém que lutou, mas que sempre parece terminar o dia derrotado: “[...] da suprema provação [...] nos silêncios do nosso próprio desespero.” (CAMPBELL, 1997, p. 376).
Cabem também às religiões – portadoras do Homem-imagem que tiram o individuo dessa condição de “desespero” – através de um, não-homem e não-Deus do qual as religiões mostram um modelo ideal, que é retratado para sublimar a própria dor humana, mas que não resolve por si só o problema daquela verdade que desejamos fundar a qual dá sentido existencial do ser humano, o Homem.

V - A dor e a fuga
Existem indivíduos que nem sabem o que é o significado da palavra verdade. Aliás, só tem entendimento de seu significado quando seus raciocínios enfrentam alguma sentença, i.e. , quando os indivíduos comparam aquilo, que por tradição, sempre lhes pareceu verdadeiro com aquilo que lhes pareceu sempre mentira. Só então podem fazer um juízo a cerca de algo. Este juízo cotidiano não representa o significado verdadeiro daquele sentido humano que persiste estar oculto tanto para a imagem do Homem como para o Homem-imagem.
Apesar de tudo, o indivíduo sempre acaba se deparando com o que acha ser verdadeiro, pois é inata no Homem aquela condição de limitada criatura participante de uma existência que tem como referência algo superior e perfeito, Deus.
As irrisórias frustrações cotidianas que potencializam ainda mais as fragilidades corpóreas: doenças; ou se não ocorrendo isto, apenas a noção de envelhecimento ou da chegada da morte, já são condições propícias à manifestação da dor existencial do Homem, donde o indivíduo aí sim vai buscar algo nunca buscado. Muito certamente irá o individuo em busca da liberdade de sua própria prisão existencial, não obstante poderá buscar através da dicotômica paranóia da fuga, fugindo sempre cada vez mais de tudo e de todos, ou de outra forma mais desejosa buscará na maneira justa e eficaz, pelo enfrentamento de sua própria dor, que é a mesma de toda humanidade.

Conclusão – O encontro sem busca
A esta altura, a que somos elevados em nossa reflexão neste singelo artigo, sentiríamos quase que uma obrigação solidária em cooperar com aquele indivíduo até aqui mostrado. Neste ponto, se faz importante a distinção entre o indivíduo particular e Homem universal. Uma vez que, no Homem está representada a universalidade do ser humano e que busca a verdade enquanto que o indivíduo se torna o cooperante único e irrepetível desta universalidade, ou seja, cooperante da verdade.
Assim tornamo-nos contraditórios se cooperarmos com o indivíduo na sua busca pela verdade, uma vez que, o correto é que ele deva transformar sua potência de cooperar em ato que se realizado então vai cooperar com a universalidade humana. Exemplificarei este conceito-problema numa pergunta: como poderei dizer algo que em verdade possa estabelecer no indivíduo sua busca pela verdade do Homem?
Como bem descreve Castañon,
“Vemos constantemente pessoas afirmarem que ‘cada um tem a sua verdade’. Evidentemente, ao pé da letra, esta frase é um absurdo conceitual comum nos dias de hoje. Por definição, se uma verdade é uma declaração adequada sobre algo real, e se a realidade independe da mente dos sujeitos particulares, sua crença particular em que algo é assim ou assado não tem nada a ver com a verdade: ela é, isto sim, uma hipótese sobre a realidade, que pode ser verdadeira ou falsa.” (2007)
A busca do sentido existencial do Homem estabelece impreterivelmente sempre a busca pela verdade quer seja de maneira apenas conceitual ou doutrinária na Ciência e na Filosofia.
No indivíduo, no particular, uma vez que, esteja confundida não pode haver busca por aquela verdade que dá sentido existencial do Homem. Se para esta verdade não pode haver busca então existe apenas encontro. Em relação com essa verdade que dá sentido existencial do Homem, tal encontro só poderá ocorrer pela sua não-busca existencial, i.e., pela negação da sua existência de indivíduo. Visto que, a busca do sentido existencial do Homem estabelece a busca pela verdade, o individuo só poderá cooperar se anular-se àquele Homem e sua finalidade existencial. Neste deixar de ser-se, quase na eminência de sua própria desintegração física e espiritual, mas ainda vivo o indivíduo, consubstancia-se à essência do ser humano – àquele Homem universal. É neste único momento que cada indivíduo, fenomenalmente encontrará sua verdade.


Referência bibliográfica:

CAMPBELL, Joseph. O herói de mil faces. Tradução: Adail Ubirajara Sobral. 10. ed. São Paulo: Cultrix/Pensamento, 1997, 414 p.

CASTAÑON, Gustavo. Introdução à espistemologia. São Paulo: EPU, 2007, 134 p.

PRADO JUNIOR, Caio. Dialética do conhecimento-Tomo II. História da dialética; lógica dialética. 2. ed. São Paulo: Editora Brasiliense, 1955, 435 p.

Armando Poli Junior