Introdução
Sempre quando escrevemos sobre Friedrich
Wilhelm Nietzsche1(1844-1900) dentro de um
contexto metafísico tal tarefa é por demais dolorosa;
porém a complexidade de Nietzsche é tal que nos sentimos espantosamente
atraídos a, pelo menos, ser feita uma singela indicação, pelo texto que segue,
para contemporizarmos Nietzsche. Contudo será tanto mais difícil a tarefa de
cifrar Nietzsche a um texto, quanto, porém com aquela grande característica
indelével, nos considerarmos batizados como nietzschianos.
Figura
1
Removendo os
tijolinhos
É
de se esperar que Nietzsche seja considerado como portador de uma metralhadora
que pretende destruir o pensamento metafísico até então vigente em sua época.
Porém tal consideração pode ser muito prejudicial ao entendimento que
pretendamos buscar sobre Nietzsche, visto que é um pesquisador e como um
pesquisador-filólogo suas palavras não podem ser uma metralhadora, uma vez que,
para tal metáfora seria ridículo trocar um humanista como Nietzsche por um
militar crente no poder coercitivo que suas armas podem causar. Mesmo assim
metralhar a histórica metafísica seria um procedimento um tanto antiético para
Nietzsche e que por isso não poderia nunca justificar sua conduta à moral que
carregava consigo. Assim vai Nietzsche estudando as bases formadoras dos
primeiros pensamentos metafísicos. A necessidade de relatar suas observações à
medida que ia retirando cada elemento da casa metafísica é com certeza a mesma
medida que se transformava de filólogo em filósofo. Cada elemento, ou cada
tijolinho que cuidadosamente retirava era para conhecer sua estrutura, sua
natureza. Então, o destruir não deve ser para Nietzsche uma premeditação
coercitiva àquela casa, mas conhecê-la, estudá-la e para tornar-se cada vez
mais lógico, Nietzsche, deveria também reconstruí-la, se não identicamente, mas
muito similar, mas agora com um algo a mais: ele mesmo. A nova casa estaria,
então, imbuída do próprio Nietzsche; seu objetivo era um novo fenômeno, não
mais a metafísica como se nos apresenta, mas a metafísica como o sujeito se
fenomena nela.
Poderá
ser interessante entender-se porque Nietzsche foi contra, por exemplo, à
metafísica de Platão:
“Nietzsche se encontrava no limiar de uma experiência do mundo em que, como conseqüência [sic] dos
progressos do conhecimento, noções como Verdade, Falsidade, Justiça, Bem, Mal, Virtude tinham sido
relativizadas, não podendo
mais responder a nossa eterna pergunta pelo sentido da existência.” (GIACOIA JUNIOR, 2000, p. 10)
Os
conceitos são para Nietzsche o ponto nevrálgico onde elabora sua estratégia
crítica que se dará porque os entende como relativizados, banalizados, uma vez
que, o mundo os tratou não como realidade e inerente do nascimento ao
perecimento de uma vida humana ao longo de seu desenvolvimento
metafísico-filosófico, mas como um ideal-imaginário um tanto quanto histórico,
e por causa deste “um tanto quanto
histórico”, seriam assumidos tais conceitos como reais e consequentemente,
próximos ao Absoluto. Sobre as metafísicas que o homem vai
desenvolvendo ao longo de sua existência, vão sendo criados certos conceitos sobre valores absolutos.
Entretanto para Nietzsche estes conceitos
sobre valores absolutos, desde aquela original metafísica de Platão, nunca
poderiam correr o risco de perderem seus significados
por causa do progresso do conhecimento humano. Nietzsche vai à busca da
resignificação do homem; desconstrói a metafísica de Platão para assegurar a
certeza do destino do homem:
“Não se pode,
porém, extrair as últimas
conclusões desse impulso crítico sem retomar á sua origem, isto é, para Nietzsche, a metafísica de Platão. Por essa
razão, uma das primeiras e mais
fundamentais tarefas que Nietzsche se atribui é a de refutar e destruir a metafísica platônica.” (GIACOIA JUNIOR, 2000, p. 12)
Careceria
neste ponto indagar ao comentador Giacoia Junior se seria intenção verdadeira
de Nietzsche destruir a metafísica platônica e se, se fosse realmente esta sua
intenção, então o comentador deveria refutar o próprio Nietzsche, uma vez que,
Nietzsche seria contraditório por deixar de imaginar que algum dia alguém
destruísse seu próprio pensamento metafísico. Nisto me valho de uma oportuna
consideração que Matos Júnior relembra: “[...] ninguém rejeita impunemente a
metafísica. Quem a nega cai na contradição de ter de supô-la no ato mesmo da
pretença negação”. (2009) É claro que poderemos em outra sequência
criticarmos se este negar à Nietzsche
poderia ser considerado como o destruir
de Giacoia Junior. Mas, por hora deve ser entendível que para um público ainda
jovial, muitos querem fazer descer goela abaixo um Nietzsche destruidor e isto
após aprofundados estudos se percebe o contrário em razão de que Nietzsche
lidava com outra realidade: o mundo sensível, caótico e heraclitiano.
Cuidando dos
tijolinhos
Da
casa, só restaram pilhas e pilhas de tijolinhos, além de outros elementos.
Nietzsche vai reconstruir a casa, mas agora cada tijolinho tem que ter as
cinzas da Fênix. Nietzsche tem de se tornar impregnável nos tijolinhos e além
do mais tem de levar consigo as cinzas da Fênix. Estas cinzas são o puro
pensamento schopenhaueriano que inicia
um renascer da Metafísica a partir do próprio Schopenhauer quando este se detém
naquilo que a introdução da Crítica da Razão Pura se limitava:
"Entretanto,
na primeira parte da Metafísica, esta dedução da nossa faculdade de conhecer a
priori conduz a um estranho resultado aparentemente muito prejudicial ao
inteiro fim da mesma e do qual se ocupa sua segunda parte, a saber, que com
esta faculdade JAMAIS PODEMOS ULTRAPASSAR OS LIMITES DA EXPERIÊNCIA POSSÍVEL
[maiúsculas nossa], o que é justamente a ocupação desta ciência [a
Metafísica]." (Kant, Os pensadores, 1999, p.40)
Nietzsche
não pode simplesmente triturar o tijolinho removido e reconstruir outro do seu
jeito. Nietzsche tem de se fazer nele sem triturá-lo, sem destruí-lo. Nietzsche
parece saber que todos os pensamentos sobre metafísica representavam a vontade
própria de cada um de seus pensadores, porém agora era necessário mais: os
tijolinhos deveriam conter uma vontade de poder. Isto significará que Nietzsche
vai tornar possível a metafísica ser conhecida de uma maneira diferente do que até então se conhecia. Uma vontade prenha de existência e potencializada
de uma moral muito mais válida. Nietzsche usa de uma estratégia muito simples,
que é anular a compreensão dos tijolinhos como elementos de uma casa realizável
pelo inteligível, pelo cosmos e por Deus. Simplesmente Nietzsche anula, isto é,
por niilismo vai resignificar a matéria tijolinho. Embora encontrada solução
simplista, porém existe para tal solução um alto preço a ser pago: Nietzsche
tem de se reconsiderar em cada tijolinho, isto é, apresentar-se a si mesmo como
um homem que deve mergulhar na lama, no submundo, no caos: esta é a única via
para o acesso à Coisa em Si de Kant.
Conclusão
Começar
a entender Nietzsche por sua metafísica requer alguns entendimentos
preliminares sobre circunstâncias que ainda estão fora de suas obras, isto é,
torna-se muito importante entender o contexto histórico-cronológico das
principais dúvidas dos pensadores até Nietzsche. Aqui se apresentam condições
apenas muitíssimas pequenas, mas que podem dar outra perspectiva para nós
infantes filósofos enquanto nos dispomos a compreender Nietzsche. Do contrário
caso se queira compreender Nietzsche iniciando diretamente em suas obras, tal
forma, como obtusa e dogmática, pode estar se incorrendo num erro crucial para
um discípulo de Zaratustra: deixar de mergulhar na lama, no submundo, no caos.
Referências
Bibliográficas:
KANT, Immanuel. Os
pensadores. Tradução: Valerio Rohden e Udo Baldur Moosburger. São Paulo:
Nova Cultural, 1999.
E-referências:
Figura 1 – Nietzsche: disponível em : http://e-ducation.net/philosophers/Nietzsche.jpg
(acesso em: 29 abril 2012).
GIACOIA JUNIOR, Oswaldo. pt.scribd.com. 2000. http://pt.scribd.com/doc/21555910/oswaldo-giacoia-jr-nietzsche-colecao-folha-explica-doc-rev
(acesso em 21 de mar de 2012).
MATOS JR, Elílio de Faria. 2009. http://padreelilio.blogspot.com.br/2009/12/kant-e-o-fim-da-metafisica.html
(acesso em 21 de mar de 2012).