Introdução
Da
obra Dialética do esclarecimento[2],
que não obstante ao ano de sua publicação, 1944, poderá dela ser retirado –
por uma análise atemporal e, portanto, que ainda pode nos dizer muito sobre
nossa atualidade – a parte que descreve uma Indústria Cultural a qual é versada
num capítulo com profundidade e maturidade filosófica ímpar, que se é difícil
penetrar em suas entranhas, então, por outro lado, demonstra uma autêntica crítica
indispensável para o Homem refletir sobre seu futuro, sobre sua evolução, não
apenas para uma evolução tecnológica, mas tão mais para uma evolução
tecnológica amparada por críticas que desnudem os por quês do próprio Homem
fazer suas escolhas na sua busca por um futuro melhor.
A
temática desta exposição trilhará um caminho apenas básico o que de maneira
alguma poderá substituir a essência da obra de Frankfurt[3] a
qual, para quem busque seu entendimento mais profícuo deverá lê-la de maneira
diligente e também crítica.
Ideia marxista como ponto de
partida
Na
obra Manuscritos econômico-filosóficos[4]
Karl Marx chama de indústria material
costumeira uma capacidade de atividade humana sob tal intensidade que
inexoravelmente ao homem está ligada, convergindo à mesma atividade não só o
próprio trabalho do homem, mas também a própria natureza sensível objetiva
humana:
Na indústria
material costumeira (que pode ser concebida como parte daquele movimento geral,
do mesmo modo que se pode conceber este como uma parte particular da indústria,
pois até agora toda atividade humana era trabalho, isto é, indústria, atividade
alienada de si mesma) temos perante nós, sob a forma de objetos sensíveis,
estranhos e úteis, sob a forma da alienação, as forças essenciais objetivadas
do homem. (MARX, 1974, Propriedade privada e comunismo,
IX, p. 19)
Esta
é, pois, uma crítica que Marx faz ao capitalismo. Quando a convergência do
produto resultante do trabalho e da natureza sensível do trabalhador não é
voltada ao trabalhador em sua humanidade, então Marx diz se tratar de uma
alienação, “[...] que é o processo pelo
qual o homem se torna estranho para si mesmo, a ponto de não se reconhecer.” (ABBAGNANO, 2007, p. 27)
A indústria cultural
Será sob este
aspecto de alienação que Adorno e Horkheimer irão estabelecer uma crítica
contundente a um sistema que põe “[...]
em funcionamento uma poderosa máquina: a indústria cultural”. (REALE e
ANTISERI, 2006, p. 474) Este termo, indústria cultural, cunhado pelos autores, terá seu estudo por uma dialética negativa. Embora Adorno opte
pela dialética hegeliana, vai divergir da dialética
da síntese[5] de Hegel:
Adorno
baseia-se na dialética da negação, na dialética negativa, isto é, na dialética
que nega a identidade entre realidade e pensamento e que, portanto, desbarata as
pretensões da filosofia de captar a totalidade do real [...] afirmando a
não-identidade entre ser e pensamento é que se pode garantir a não camuflagem
da realidade [...] (REALE e ANTISERI, 2006, p. 472-473)
O capitalismo
detém o poder. E o poder deve ser manifestado de algum modo a todos de maneira
que todos almejem, utopicamente, o mesmo poder; a ele um sentido de valor é
massificado, isto é, todos podem ter a chance de tê-lo sob várias e diversas
coisas. Aquele mesmo poder deve padronizar comportamentos. Modelos devem ser
buscados para gerar necessidades e mesmas necessidades uniformizam linguagens
para poderem pleitear através do direito
objetivo[6]:
A indústria
cultural realizou maldosamente o homem como ser genérico. Cada um é tão-somente
[sic] aquilo mediante o que pode substituir todos os outros: ele é fungível, um
mero exemplar. Ele próprio, enquanto indivíduo, é [sic] o absolutamente
substituível, o puro nada [...] (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 120)
A razão instrumental
Assim, nesta
possibilidade bem sucedida de crítica, Adorno e Horkheimer irão argumentando as
bases, ou pilares da alienação humana por uma crítica à mídia de sua época, da
qual se destacam: cinema, rádio e até televisão. Mas, importante agregar a este
contexto a arte, visto que, para ele, “A
indústria cultural pode se ufanar de ter levado a cabo [...] a transferência
muitas vezes desajeitada da arte para a esfera do consumo [...]” (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 111)
Nesta
grafia que se desenha a indústria cultural, deve haver uma sugestividade tal
que seja razoável para ser admitida universalmente. Assim, não importará se é
uma falsidade se obtiver aceitação por todos; basta haver uma razão, não aquela
suficiente[7],
mas outra: uma razão fabricada. Do excerto que se segue poderá ser inferida
esta ideia de razão fabricada como, por exemplo, a arte que vai ser
desempenhada pela indústria cultural num papel manipulador, arte leve[8] ou
diversão, e assim, por que não ser um instrumento de razão para poder ser
admitida universalmente:
A pureza da
arte burguesa, que se hipostasiou como reino da liberdade em oposição à práxis
material, foi obtida desde o início ao preço da exclusão das classes
inferiores, mas é à causa destas classes – a verdadeira universalidade – que a
arte se mantém fiel exatamente pela liberdade dos fins da falsa universalidade.
(Ibidem, p. 111)
Law (2009, p. 333) consegue uma conceituação mais
próxima para esta razão instrumental: “a
aceitação pressurosa e acrítica da ‘razão’ – que, em vez de ser uma força para
a libertação, tornou-se hoje mais um mecanismo de controle social através da
tecnologia”.
Conclusão
Com
temática rica, eloquente e grande profundidade argumentativa a obra de Adorno e
Horkheimer, Dialética do esclarecimento (1985), poderia, neste estudo, ter o
recorte da Indústria cultural da própria Dialética do esclarecimento (1985),
uma vez que, o recorte dado a este tema foi da Teoria Crítica. Embora isto
passe despercebido, deve ser considerado que o recorte trata de uma dialética,
como visto, uma vez presumivelmente conhecida a fundamentação dialética de
Adorno. Assim, se a crítica à Indústria cultural é dura e recrudescedora, então
é possível amparar seus autores apenas e tão somente na dialética, certos de
que esta crítica deve ser ampliada e não sugestionar uma constrangedora atitude
de impô-la de qualquer maneira não se importando com os meios que se fizerem
necessários a este fim. Não. Será pela dialética, mais especificamente do
esclarecimento que a massa vai se tornando indivíduo e sendo indivíduo viva seu
momento com humanidade até o último dia de sua vida.
Referência Bibliográfica
ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. Tradução de Alfredo Bosi e
Ivone Castilho Benedetti. 5. ed. rev e ampl. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
1210 p.
ADORNO, T. L. W.; HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento.
Tradução de Guido Antonio Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985. 224
p.
LAW, S. Guia ilustrado Zahar: filosofia. 2. ed. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar Editor, 2009. 352 p.
MARX, K. H. Os pensadores. Tradução de José Arthur Giannotti. São
Paulo: Abril Culltural, v. XXXV, 1974. 416 p. [ Tit. curto: Manuscritos
econômico-filosóficos; outros textos escolhidos ].
REALE, G.; ANTISERI, D. História da filosofia: de Nietzsche à
Escola de Frankfurt. São Paulo: Paulus, v. 6, 2006. 496 p.
SANTOS, I. E. D. Manual de métodos e técnicas de pesquisa científica.
7. ed. rev. e atualiz. Niterói: Impetus, 2010. 381 p.
E referência
WIKIPÉDIA. Escola de Frankfurt, 2012. Disponivel em:
. Acesso em: 1º set.
2012.
[1] “Teoria crítica, que passou à história com a
denominação de ‘Escola de Frankfurt’” (ABBAGNANO,
2007)
[2] (ADORNO e
HORKHEIMER, 1985)
[3] “A segunda fase da teoria crítica da Escola
de Frankfurt se centra principalmente em dois trabalhos: Dialética do
Esclarecimento (1944) de Horkheimer e Adorno e Minima Moralia (1951) de Adorno.
[...] o Instituto deixou a Alemanha para Genebra antes de se mudar para Nova
Iorque, em 1935, onde tornou-se afiliado da Universidade Columbia. [...]Foi
apenas em 1953 que o Instituto foi formalmente restabelecido em Frankfurt. ”
(WIKIPÉDIA, 2012)
[4] (MARX, 1974)
[5] Fenomenologia
do espírito
[6] “O que esta [a arte séria] perdeu em termos de verdade confere àquela
[arte leve (diversão)] a aparência de um direito
objetivo.[grifo nosso]” (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 112)
[7] Razão
suficiente, o mesmo que Fundamento. (ABBAGNANO, 2007, p. 975)
[8] “Ela é a
má consciência social da arte séria.” (ADORNO e
HORKHEIMER, 1985, p. 112)
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