sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Adorno e Horkheimer: Indústria Cultural: um recorte da Teoria Crítica[1]

Introdução
            Da obra Dialética do esclarecimento[2], que não obstante ao ano de sua publicação, 1944, poderá dela ser retirado – por uma análise atemporal e, portanto, que ainda pode nos dizer muito sobre nossa atualidade – a parte que descreve uma Indústria Cultural a qual é versada num capítulo com profundidade e maturidade filosófica ímpar, que se é difícil penetrar em suas entranhas, então, por outro lado, demonstra uma autêntica crítica indispensável para o Homem refletir sobre seu futuro, sobre sua evolução, não apenas para uma evolução tecnológica, mas tão mais para uma evolução tecnológica amparada por críticas que desnudem os por quês do próprio Homem fazer suas escolhas na sua busca por um futuro melhor. 
            A temática desta exposição trilhará um caminho apenas básico o que de maneira alguma poderá substituir a essência da obra de Frankfurt[3] a qual, para quem busque seu entendimento mais profícuo deverá lê-la de maneira diligente e também crítica.

Ideia marxista como ponto de partida
            Na obra Manuscritos econômico-filosóficos[4] Karl Marx chama de indústria material costumeira uma capacidade de atividade humana sob tal intensidade que inexoravelmente ao homem está ligada, convergindo à mesma atividade não só o próprio trabalho do homem, mas também a própria natureza sensível objetiva humana:
Na indústria material costumeira (que pode ser concebida como parte daquele movimento geral, do mesmo modo que se pode conceber este como uma parte particular da indústria, pois até agora toda atividade humana era trabalho, isto é, indústria, atividade alienada de si mesma) temos perante nós, sob a forma de objetos sensíveis, estranhos e úteis, sob a forma da alienação, as forças essenciais objetivadas do homem.  (MARX, 1974, Propriedade privada e comunismo, IX, p. 19)
            Esta é, pois, uma crítica que Marx faz ao capitalismo. Quando a convergência do produto resultante do trabalho e da natureza sensível do trabalhador não é voltada ao trabalhador em sua humanidade, então Marx diz se tratar de uma alienação, “[...] que é o processo pelo qual o homem se torna estranho para si mesmo, a ponto de não se reconhecer.” (ABBAGNANO, 2007, p. 27)

A indústria cultural
Será sob este aspecto de alienação que Adorno e Horkheimer irão estabelecer uma crítica contundente a um sistema que põe “[...] em funcionamento uma poderosa máquina: a indústria cultural”. (REALE e ANTISERI, 2006, p. 474) Este termo, indústria cultural, cunhado pelos autores, terá seu estudo por uma dialética negativa. Embora Adorno opte pela dialética hegeliana, vai divergir da dialética da síntese[5] de Hegel:
Adorno baseia-se na dialética da negação, na dialética negativa, isto é, na dialética que nega a identidade entre realidade e pensamento e que, portanto, desbarata as pretensões da filosofia de captar a totalidade do real [...] afirmando a não-identidade entre ser e pensamento é que se pode garantir a não camuflagem da realidade [...]  (REALE e ANTISERI, 2006, p. 472-473)
O capitalismo detém o poder. E o poder deve ser manifestado de algum modo a todos de maneira que todos almejem, utopicamente, o mesmo poder; a ele um sentido de valor é massificado, isto é, todos podem ter a chance de tê-lo sob várias e diversas coisas. Aquele mesmo poder deve padronizar comportamentos. Modelos devem ser buscados para gerar necessidades e mesmas necessidades uniformizam linguagens para poderem pleitear através do direito objetivo[6]:
A indústria cultural realizou maldosamente o homem como ser genérico. Cada um é tão-somente [sic] aquilo mediante o que pode substituir todos os outros: ele é fungível, um mero exemplar. Ele próprio, enquanto indivíduo, é [sic] o absolutamente substituível, o puro nada [...] (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 120)

A razão instrumental
Assim, nesta possibilidade bem sucedida de crítica, Adorno e Horkheimer irão argumentando as bases, ou pilares da alienação humana por uma crítica à mídia de sua época, da qual se destacam: cinema, rádio e até televisão. Mas, importante agregar a este contexto a arte, visto que, para ele, “A indústria cultural pode se ufanar de ter levado a cabo [...] a transferência muitas vezes desajeitada da arte para a esfera do consumo [...]” (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 111)
            Nesta grafia que se desenha a indústria cultural, deve haver uma sugestividade tal que seja razoável para ser admitida universalmente. Assim, não importará se é uma falsidade se obtiver aceitação por todos; basta haver uma razão, não aquela suficiente[7], mas outra: uma razão fabricada. Do excerto que se segue poderá ser inferida esta ideia de razão fabricada como, por exemplo, a arte que vai ser desempenhada pela indústria cultural num papel manipulador, arte leve[8] ou diversão, e assim, por que não ser um instrumento de razão para poder ser admitida universalmente:
A pureza da arte burguesa, que se hipostasiou como reino da liberdade em oposição à práxis material, foi obtida desde o início ao preço da exclusão das classes inferiores, mas é à causa destas classes – a verdadeira universalidade – que a arte se mantém fiel exatamente pela liberdade dos fins da falsa universalidade. (Ibidem, p. 111)
Law (2009, p. 333) consegue uma conceituação mais próxima para esta razão instrumental: “a aceitação pressurosa e acrítica da ‘razão’ – que, em vez de ser uma força para a libertação, tornou-se hoje mais um mecanismo de controle social através da tecnologia”.

Conclusão
            Com temática rica, eloquente e grande profundidade argumentativa a obra de Adorno e Horkheimer, Dialética do esclarecimento (1985), poderia, neste estudo, ter o recorte da Indústria cultural da própria Dialética do esclarecimento (1985), uma vez que, o recorte dado a este tema foi da Teoria Crítica. Embora isto passe despercebido, deve ser considerado que o recorte trata de uma dialética, como visto, uma vez presumivelmente conhecida a fundamentação dialética de Adorno. Assim, se a crítica à Indústria cultural é dura e recrudescedora, então é possível amparar seus autores apenas e tão somente na dialética, certos de que esta crítica deve ser ampliada e não sugestionar uma constrangedora atitude de impô-la de qualquer maneira não se importando com os meios que se fizerem necessários a este fim. Não. Será pela dialética, mais especificamente do esclarecimento que a massa vai se tornando indivíduo e sendo indivíduo viva seu momento com humanidade até o último dia de sua vida.

Referência Bibliográfica

ABBAGNANO, N. Dicionário de filosofia. Tradução de Alfredo Bosi e Ivone Castilho Benedetti. 5. ed. rev e ampl. São Paulo: Martins Fontes, 2007. 1210 p.
ADORNO, T. L. W.; HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento. Tradução de Guido Antonio Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985. 224 p.
LAW, S. Guia ilustrado Zahar: filosofia. 2. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2009. 352 p.
MARX, K. H. Os pensadores. Tradução de José Arthur Giannotti. São Paulo: Abril Culltural, v. XXXV, 1974. 416 p. [ Tit. curto: Manuscritos econômico-filosóficos; outros textos escolhidos ].
REALE, G.; ANTISERI, D. História da filosofia: de Nietzsche à Escola de Frankfurt. São Paulo: Paulus, v. 6, 2006. 496 p.
SANTOS, I. E. D. Manual de métodos e técnicas de pesquisa científica. 7. ed. rev. e atualiz. Niterói: Impetus, 2010. 381 p.

E referência
WIKIPÉDIA. Escola de Frankfurt, 2012. Disponivel em: . Acesso em: 1º set. 2012.



[1] “Teoria crítica, que passou à história com a denominação de ‘Escola de Frankfurt’” (ABBAGNANO, 2007)
[2]  (ADORNO e HORKHEIMER, 1985)
[3] “A segunda fase da teoria crítica da Escola de Frankfurt se centra principalmente em dois trabalhos: Dialética do Esclarecimento (1944) de Horkheimer e Adorno e Minima Moralia (1951) de Adorno. [...] o Instituto deixou a Alemanha para Genebra antes de se mudar para Nova Iorque, em 1935, onde tornou-se afiliado da Universidade Columbia. [...]Foi apenas em 1953 que o Instituto foi formalmente restabelecido em Frankfurt. ” (WIKIPÉDIA, 2012)
[4]  (MARX, 1974)
[5]  Fenomenologia do espírito
[6]  “O que esta [a arte séria] perdeu em termos de verdade confere àquela [arte leve (diversão)] a aparência de um direito objetivo.[grifo nosso]” (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 112)
[7] Razão suficiente, o mesmo que Fundamento.  (ABBAGNANO, 2007, p. 975)
[8] “Ela é a má consciência social da arte séria.” (ADORNO e HORKHEIMER, 1985, p. 112)

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